Transplante Hepático

TRANSPLANTE HEPÁTICO

O Fígado

O fígado é o maior órgão sólido do corpo humano, localizado no lado direito do abdome e pesa entre 1.200 e 1.500g. É dividido em 2 lobos, sendo divididos em 8 segmentos independentes. Ele é constituído por milhões de células, recebe o sangue venoso que vem em sua maior parte do trato gastrintestinal através de uma grande veia: a veia porta, formada pelas veias esplênica e mesentérica superior, responsável por 70% do fluxo hepático, além da artéria hepática, responsável por 30% do fluxo sanguíneo. O sangue passa pelo fígado e retorna para a circulação sistêmica através das veias hepáticas que se comunicam diretamente com a veia cava inferior. No transplante de fígado, todas estas estruturas são reconectadas ao novo órgão. No fígado também iniciam pequenos ductos provenientes de cada segmento hepático que se unem até formar uma estrutura principal chamada ducto colédoco, responsável pelo transporte da bile produzida no fígado ao intestino. A vesícula biliar é um órgão anexo ao fígado que serve para armazenar a bile produzida.

 

O fígado é extremamente importante para manter o corpo saudável, ele produz e depura diversas substâncias. Entre suas funções, as mais importantes são:

  • Receber os nutrientes e as substâncias absorvidas no intestino;
  • Metabolizar diversos medicamentos;
  • Neutralizar eventuais substâncias tóxicas que sejam ingeridas;
  • Armazenar nutrientes e produzir substâncias importantes para o organismo, como a albumina, os fatores de coagulação e o colesterol;
  • Ajudar a regular a concentração de glicose no sangue;
  • Produzir a bile: responsável pela absorção de nutrientes no intestino, como gorduras e vitaminas;

 

Doenças do Fígado

São várias as doenças que podem atingir o fígado. Os sintomas variam conforme a evolução e a gravidade da doença, alguns dos mais comuns são: icterícia (o amarelão), ascite (retenção de líquido no abdome), fadiga (cansaço), sangramento gastrointestinal (hematemese, melena), fraqueza muscular, urina escura (colúria), náuseas e vômitos, fezes esbranquiçadas (acolia) e distúrbios do sono/confusão mental (encefalopatia hepática). Dependendo dos danos causados ao órgão pela doença de base, podem ocorrer alterações na absorção de vitaminas e nutrientes, acúmulo de substâncias tóxicas no organismo e redução da produção de proteínas e outros fatores necessários para a coagulação sanguínea.

Entre as principais doenças do fígado estão: as hepatites virais (chamadas por letras: A,B,C,D,E), esteatose hepática, hepatite auto-imune, hepatite causada pelo álcool ou medicamentos e a cirrose. Outras doenças do fígado são: doenças metabólicas, genéticas e infiltrativas, colangite esclerosante, colangite biliar primária, hemocromatose. A maioria destas doenças evolui de forma silenciosa e, quando se manifesta, já pode ter cirrose, uma doença hepática cronica e irreversível. Caso a alteração hepática seja muito grave, o transplante pode ser necessário. Outra frequente indicação de transplante de fígado são os tumores hepáticos (principalmente o hepatocarcinoma) e a insuficiência hepática  aguda fulminante.

 

Quando é necessário um Transplante de Fígado?

Qualquer pessoa com insuficiência hepática ou cancer primário de fígado pode ser candidato ao transplante hepático, depois de esgotadas todas as demais alternativas de tratamento clínico e cirúrgico. O transplante de fígado é claramente justificado em doenças hepáticas que apresentam grave comprometimento à saúde do paciente e redução da qualidade e expectativa de vida. cuja progressão da doença hepática se não transplantdos,  resulte em mortalidade que exceda aquela decorrente do próprio transplante.

 Para indicar o transplante de fígado são seguidas normas do Ministério da Saúde descritos na Portaria 2600 de 21 de outubro de 2009. Entretanto, pessoas que sofrem de doenças sistêmicas que possam colocar a sua vida em risco, como: infecção extra-hepática não controlada, doença cardiovascular ou pulmonar ou neurológica avançada pré-existente, metástases de tumores malignos, colangiocarcinoma de grandes dutos, doença alcoólica com menos de 6 (seis) meses de abstinência e polineuropatia amiloidótica familiar avançada grau IV não podem realizar o transplante de fígado, conforme a Portaria Nº 541, de 14 de março de 2002.

 

O processo da doação de órgãos

A notificação de potenciais doadores de órgãos e tecidos em estado de Morte Encefálica por todos os hospitais é obrigatória pelo Decreto Nº 2.268, de 30 de junho de 1997 que regulamenta a Lei nº 9.434, de 4 de fevereiro de 1997.Mesmo assim a desproporção crescente do número de pacientes que necessitam de um transplante versus o número de doadores é um fato inquestionável. Dentre os fatores limitantes, está a não notificação de pacientes com diagnóstico de morte encefálica às Centrais de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos. Apesar de sua obrigatoriedade prevista em lei, a falta de política de educação continuada aos profissionais da saúde referente ao processo de doação-transplante, além da recusa familiar, são entraves importantes à captação de órgãos. Após o diagnóstico de morte encefálica a família deve ser consultada e orientada sobre o processo de doação de órgãos, sendo que esta conversa pode ser realizada pelo próprio médico do paciente, pelo médico da UTI ou pelos membros da equipe de captação, que prestam todas as informações que a família necessitar. Para ser doador é muito simples, basta avisar sua família sobre seu desejo de ser doador.

A família não paga pelos procedimentos de manutenção do potencial doador, nem pela retirada dos órgãos. Existe cobertura do Sistema Único de Saúde (SUS) para isso.

 

 

Quais são as maneiras de aumentar o número de doações?

– Aumentar o número de notificações de morte encefálica, pois se trata de caso de notificação compulsória;

– Buscar junto à sociedade diminuir os índices de recusa familiar. Para isso as campanhas pela doação de órgãos são planejadas e acontecem todos os anos.

 

Da declaração da morte até a retirada dos órgãos e a entrega do corpo à família

O diagnóstico da morte encefálica leva por volta de 12 horas para ser feito e após esse período a família tem que decidir se doa ou não. Se a doação é autorizada, são feitos exames no doador para certificar se ele não é portador de nenhuma doença infecciosa que possa ser transmitida ao receptor. Em seguida são realizadas avaliações laboratoriais e clínicas para avaliar a função de cada órgão para que a equipe de transplantes decida qual órgão é viável ou não. A Central de Transplantes é informada sobre o doador, então é preenchido um documento e autorizada a cirurgia do doador, marcada após a chegada do documento à Central. Após este processo de avaliação a Central de Notificação e Distribuição de Órgãos (CNCDO) precisa contatar as equipes transplantadoras, realizar a seleção do receptor para que possam confirmar se este está em condições de receber o órgão ou não. Os órgãos são retirados simultaneamente em uma cirurgia que demora de duas a três horas. Então, finalmente o corpo é entregue a família, no entanto se for morte violenta, obrigatoriamente, tem que ir para o Instituto Médico Legal (IML). O processo todo leva em média 36 horas.

 

O que é Morte Encefálica?

O conceito de Morte Encefálica (ME) compreende a parada completa e irreversível de todas as funções neurológicas intracranianas, considerando-se tanto os hemisférios cerebrais como o tronco encefálico. As principais causas de Morte Encefálica são: trauma de crânio por acidente de automóvel, moto, ferimento por arma de fogo, atropelamento, acidente vascular cerebral (AVC, derrame). Existem regras a serem seguidas no caso da morte encefálica através de um protocolo. No Brasil, tal protocolo é especialmente rigoroso: são feitos dois exames clínicos, com um intervalo de seis horas, além de exames laboratoriais e a participação de médicos diferentes, inclusive o médico da família pode participar.

 

O Doador Falecido

O doador cadáver é sempre um indivíduo com morte encefálica. A necessidade de funcionamento imediato do fígado transplantado impõe um rigor particular na escolha do doador, quaisquer que sejam as condições de urgência do receptor. Para reduzir os riscos, é preciso avaliar cuidadosamente a história clínica/exame físico do doador. São realizados exames laboratoriais e sorológicos do doador (análise bioquímica, hematológica, testes de função hepática e renal, sorologias para hepatite, sífilis, Chagas, CMV e HIV) além da avaliação visual e manual do fígado pelo cirurgião o que ajuda na tomada de decisão de se utilizar o órgão doado.

 

 

 

 

 

 

O Receptor

Escolher um receptor deve obedecer a critérios bem estabelecidos. O organismo do paciente deve comportar o fígado a ser recebido, inteiro ou reduzido, e o tipo sanguíneo ABO deve ser compatível.

 

Fila única à espera de um transplante

Quando a única alternativa de tratamento para quem sofre de insuficiência hepática aguda ou cronica é receber um novo órgão, começa outra etapa: a inscrição no sistema de fila única e a espera. Os dados clínicos inscritos nesse sistema formam o cadastro técnico referente a cada tipo de órgão, parte ou tecido a ser transplantado. A inscrição na lista de candidato ao transplante é feita pelo médico responsável da equipe de transplantes na Central de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos (CNCDO). A lista única para transplantes obedece a critérios de compatibilidade ABO, morfológicos, cronológicos e de gravidade. Os pacientes são escolhidos através de um programa informatizado do Sistema Nacional de Transplantes que indica os receptores mais adequados, segundo critérios previamente definidos. Ninguém pode alterar a sequencia da lista única. Cada inscrito pode acompanhar sua posição na lista junto à Central de Transplantes do Estado. A cada vez que surge um doador a Central de Captação de órgãos é informada e processa a seleção dos possíveis receptores para os vários órgãos. Esta seleção leva em conta a compatibilidade de tipo sanguíneo e sistema ABO, compatibilidade anatômica (peso e altura), clínica e sorológica do doador e gravidade (MELD-Na e/ou situação especial), além do tempo de espera para o transplante.

O MELD (Model for End Stage Liver Disease) estima a gravidade do quadro e as chances de sobrevida em 90 dias de candidatos ao transplante a partir de quatro variáveis laboratoriais: o RNI (derivado do tempo de protrombina), o nível de bilirrubinas, a função renal estimada pelo nível de creatinina e o sódio. O resultado vai de 6 a 40, sendo que quanto maior o escore, maior a gravidade e pior o prognóstico. O ordenamento dos candidatos em lista obedece o valor do MELD, em valor decrescente. Assim, aquelas pessoas com maior urgência para o procedimento, que não podem aguardar muito, são transplantadas primeiro. Isto faz com que nem sempre o mais antigo (o que chegou primeiro na fila) fique em primeiro lugar. Outras vezes o receptor que foi selecionado em primeiro lugar pode não estar momentaneamente em condições de receber um transplante, em consequência de complicações clínicas ou por não ter sido localizado, não querer ser transplantado naquele momento, etc. Os critérios de distribuição de órgãos estão sempre sendo estudados com o objetivo de aperfeiçoar e oferecer melhores cuidados aos pacientes que aguardam em fila de espera. Assim estes critérios descritos podem sofrem algumas alterações e, por isso este manual está em constante atualização.

Portaria do MELD: Nº 1.160 de 29 de maio de 2006. (www.anvisa.gov.br/legis) e PORTARIA Nº 2.049, DE 9 DE AGOSTO DE 2019.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

MORTALIDADE E SOBREVIDA

A taxa de sobrevida é utilizada pelos médicos como uma forma padrão para discutir o prognóstico de um paciente. A taxa de sobrevida em 5 anos se refere à porcentagem de pacientes que vivem pelo menos 5 anos após o transplante. A taxa de sobrevida não prevê quanto tempo cada pessoa viverá, mas permite entender a probabilidade de sucesso do tratamento.

As taxas de sobrevida dos pacientes após transplante hepático são de 82% em 1 ano, 71 % em 5 anos, 61% em 10 anos e 43% em 20 anos (J Hepatol: 2012 Sep;57(3):675-88).

A curva de sobrevivência é decrescente com o tempo, com uma probabilidade de sobrevivência menor à medida que aumenta o tempo de acompanhamento do paciente que sobreviveu a essa cirurgia. Se, por um lado, a inclinação dessa curva no primeiro ano pós- transplante representa que a mortalidade desses pacientes é bem maior no primeiro ano pós- transplante. Essas evidências ressaltam a necessidade da priorização da atenção à saúde desses pacientes no primeiro ano pós-transplante de fígado, de forma a almejar melhores resultados em termos de saúde pública, buscando aumentar a taxa de sobrevida.

 

 

Qual é o índice de mortalidade nos transplantes hepáticos?

 

Teoricamente, todas as cirurgias podem ter complicações fatais. Atualmente, no intraoperatório, o índice de mortalidade é muito baixo e está associado a situações extracirúrgicas. Alguns doentes não sobreviveram porque tiveram infarto do miocárdio na sala de cirurgia ou por condições hemodinâmicas graves dependentes de hipertensão pulmonar. No entanto, a cirurgia em si não representa maior risco de morte, a não ser que ocorra uma coagulopatia intratável pelos métodos de dispomos até o momento.

No pós-operatório imediato, podem surgir outras complicações. Uma delas é o não funcionamento primário do fígado que, segundo as estatísticas, ocorre em mais ou menos 10% dos casos. Na verdade, qualquer órgão pode não funcionar depois do transplante. Evidentemente, quando o coração não funciona, não existe solução. Mas, se for o rim, o paciente faz diálise até completar as duas ou três semanas de insuficiência renal aguda pós-transplante, geralmente recupera a função renal, sai da diálise e vai para casa. O fígado que não funciona está numa situação intermediária. A mortalidade não é imediata e o doente volta para a lista de espera, onde é priorizado para um retransplante de urgência.